Atualidade

23 de julho de 2010

3 meses depois, a Arte continua desiludida e estamos bem assim. O Perdão deixou de ser ilusão e sublimou-se, tornando-se concreto e corriqueiro, do tipo que aceita ir tomar um café no Starbucks. Já a confiança mostrou seus dois lados: O da impressão errada que eu tinha (e que me iludiu de fato) e a da ilusão com que confiam em mim. Não sei qual das duas me dá maior medo.

Hoje

22 de abril de 2010

Foi um dia de desilusões: A da Arte, a da Confiança e a do Perdão.

Pelo menos, arte por arte não dói.

Não se chama “diário” à toa

12 de novembro de 2009

Já foram mais de cinco as conversas que tive recentemente com amigos que, de tempos em tempos, costumam revirar seu baú digital para relembrar os tempos que já foram. Seja para rir de como mudamos ou se preocupar com nossas constâncias, talvez todos precisemos nos enquadrar em linhas do tempo de vez em quando.

Por causa disso, proclamo orgulhosamente que mantenho o mesmo fotolog há mais de 5 anos.

O exercício de se reencontrar em fotografias organizadas em ordem cronológica é uma das poucas oportunidades de se entreter e se resgatar ao mesmo tempo que já conheci.

Depois

5 de novembro de 2009

Ele já acenava para ela do outro lado da rua. Olhou para os dois lados algumas vezes antes de atravessar e com passos pesados de quem não quer correr, mas anda rápido, chegou até o abraço e conseqüente beijo. Quando você beija duas pessoas no mesmo dia, o segundo parece desanimado, gosto de obrigação. Mas lá estava ele, com lábios tensionados para os dois lados, o hálito de sempre e a mão tão carinhosa. Perguntas triviais, respostas típicas. Sol de tarde de primavera com vento, não seria incômodo andar de mãos dadas não fosse a falta de vontade de qualquer contato físico naquele momento. Ainda assim, os dedos se alocavam no conforto tão conhecido. Sentaram em algum canto bom de sentar e conversar. Ele falava de coisas cotidianas com paixão e seus olhos se perdiam na cidade. Ela notava o quanto ele estava opaco, seja em pele, voz ou verde dos olhos. Todas as manias e defeitos com os quais ela aprendeu a conviver – alguns depois de muito esforço – ali, bem na sua frente, junto do que ela sempre admirou nele, do que sempre lhe chamou a atenção. E tudo isso era observado minuciosamente enquanto ele falava do trabalho (ou seria da conversa com o primo? Ela não prestou tanta atenção assim nas palavras) e eram assuntos freqüentes em sua mente ultimamente, tanto o que aceitou, quanto o que sempre desejou. Refletia e ponderava, mas se virasse a cabeça para qualquer outro lado por qualquer segundo que fosse, eram outros olhos que lhe vinham à mente. Uns nada verdes, de nada opacos. Os olhos que vinham com aquela primeira boca do dia, aquela boca que falava palavras que ela não conseguia esquecer. Os detalhes eram vívidos, cada sorriso, cada folha balançando com o vento atrás dele enquanto conversavam na varanda sobre coisas que lhes faziam rir. Tudo vinha à mente em pequenas cenas de cortes rápidos, todos os pormenores que pareciam ritmados, musicais. Não deu tempo de ouvi-los, ele tinha feito alguma pergunta e a opacidade estava ali de novo. Ela admitiu a distração mexendo a cabeça para os dois lados e piscando lentamente. Ele repetiu a pergunta, era alguma opinião sobre algum fato que lhe parecia familiar, provavelmente já conversaram sobre isso antes. Respondeu que sim sem pensar muito, era melhor concordar naquela situação. O assunto foi retomado enquanto ela analisava os ângulos do rosto dele. Tão bonito como sempre. Era bonito e sem brilho, expressões desgastadas pela convivência, ainda que nutridas com amor. E amavam-se, sempre tinha sido tão mútuo, não fazia sentido estar acontecendo tudo aquilo. Ela nem percebeu o rosto descendo enquanto o raciocínio mais uma vez se formava, a idéia que ninguém precisou fazer nada para que a situação acontecesse, ninguém seduziu ou se submeteu, foi tudo natural. Ela não estava infeliz com o que já tinha, mas era mais feliz agora com o que aconteceu, ainda que o presságio do quanto as coisas seriam difíceis dali pra frente ameaçasse algum frio na barriga e tontura pré-desmaio que provavelmente só viriam totalmente mais tarde. Com certeza, não seria simples. Olhou para os olhos verdes que a observavam esperando alguma resposta novamente. Ela repetiu o gesto anterior, mas ele não refez a pergunta. Apenas sorriu e perguntou se ela estava cansada. Ela respondeu que sim, ele a beijou no cantinho entre o olho e o cabelo e falou que a levaria para casa.

desabafo na madrugada de 12 de setembro de 2009

12 de setembro de 2009

Eu não gosto da vida pós-moderna. Gosto do conhecimento ao meu alcance, dos meios de transporte e de comunicação e de ter música no meu ouvido que só eu ouço, mas não gosto da vida pós-moderna. Ah, gosto também da distância que posso impôr às pessoas, mas é a própria contemporaneidade que me força atitudes assim. Não gosto dos padrões extra-complexos de liberdade de escolha aos quais eu tento tão fortemente me enquadrar, essa adrenalina de achar que posso ser várias coisas ao mesmo tempo, até mesmo ser eu mesmo. Odeio toda a pressão de tanta coisa ao mesmo tempo em todos os lugares e para todos. Odeio como as pessoas criam virtualidades e vêem os outros por trás da cortina do consumismo e individualismo.

Somos a prosopopéia daquilo que queremos que os outros sejam.

Push

31 de agosto de 2009

“Não sei se já fui alguma vez bom o bastante. Estou um pouco enferrujado e acho que minha cabeça já desistiu. E não sei já fui amado por alguma mão que me tocou e acho que isso deve servir pra alguma coisa, mas estou um pouco bravo agora. Bem, isso aqui não acabou, não enquanto eu ainda te preciso. Você não me deve nada e nós podemos mudar: Nós podemos nos sentir bem. Quero você à minha disposição, quero te reduzir, não quero te dar valor e é isso o que vou fazer. Eu não sei porquê você mentiria para mim como se eu não merecesse confiança, quando eu sei que a verdade vai te machucar. E eu não sei porquê você não podia ficar comigo, não conseguia nem ficar perto de mim, quando meu rosto não parecia mais brilhar porque está um pouco sujo. Diga alguma coisa, me fale coisas legais, porque já fui traído e enganado e você não me conhece, eu não consigo mudar e nem vou tentar. Não tente me surpreender, espere um pouco porque as coisas estão uma bagunça, as coisas estão loucas. Não me apresse. Te quero à minha disposição, quero te reduzir e não te dar o devido valor.”

(tradução livre da músida do Matchbox Twenty)

resistência

16 de junho de 2009

“Mas, Dé, você já aguentou mais do que qualquer ser humano precisava suportar” foi o que ele me disse. Sorri na melancolia de quem não é forte o bastante pra reconhecer a própria força. Fui sincero em deslocar um pouco o assunto e continuar resistindo em saber meus próprios limites, seja na dor ou no que me couber passar.

E eu não sei onde queria chegar com isso, mas queria pôr pra fora, mesmo.

fragmentos

27 de maio de 2009

Em cada inter-relação, um pedaço fica e outro vai. Não importa quão mínima a interação tenha sido, pelo menos um pouco foi trocado. As marcas do que um dia me passaram eu dôo livremente a qualquer um que encontro na rua, no virtual ou no íntimo. Almas metamorfadas em constante trânsito entre si. Somos todos complexos conjuntos de fragmentos interdependentes, consequências dos que os outros já foram e são em suas ligações. Pedaços que nunca mais teremos de volta e, mesmo se nos fossem devolvidos, estariam completamente modificados.

Passividade é mera ilusão.

hipótese

27 de abril de 2009

Talvez eu seja abstrato assim no meu dia a dia porque de concreto já bastam meus sentimentos.

(a)cúmulo

22 de abril de 2009

Uma coisa é permanecer na avalanche da qual tanto divago, mas outra coisa é inventar os tais botões de pausa que a vida não fornece e  não somente esse intervalo ser conturbado, mas o retorno à normalidade te impelir bruscamente aos trilhos previamente desgastados.

Seja com palavras, com fatos, com voltar e encontrar tudo exatamente como deixou e encontrar coisas que deixaram para você.

É então que cai a ficha que quem permanece na avalanche não fica em lugar nenhum, mas é jogado de um lado pro outro constantemente.

bilhete

14 de abril de 2009

Sonhei com você. Íamos nos encontrar (deixando claro que éramos só amigos) e eu tava nervoso. Sua mãe tava brava comigo (nossa, de onde eu tirei isso?) e eu tinha medo que você me beijasse. Nos desencontramos e eu acordei meio do nada. Não teve fim, tipo na vida real. Só foi aquilo de, de repente, estarmos no passado. Fico triste por eu ter sido tão especial pra você. Desculpa. Um beijo.

Durma

4 de abril de 2009

“Olhos abertos. Acordou de súbito com uma inquietação que o fazia virar para todos os lados na cama, em uma velocidade que o cobertor não acompanhava. Pela janela, a lua e seus tantos pontos brilhosos pareciam oblívios à movimentação sobre o colchão. O vento sussurrava o convite de abrir as cortinas. Ele se sentou na cama e olhou para fora. Lá estava. Lá. No alto do rochedo de onde as ondas pareciam pequenininhas de tão lá embaixo. Tão perto e tão longe. Quando se deu conta, viu sua mão girar a maçaneta e saiu correndo para encontrá-la. Saiu assim, sem se arrumar, como estava, meio sem vestir coisa nenhuma. E correu mesmo, escalou todo o rochedo na maior velocidade cambaleante de quem não acredita estar se aproximando do alvo. O vestido dela acompanhava o cabelo que dançava ao luar. Suas pernas não se mexiam, mas todo o resto parecia dançar. Imóvel e bailante. Ele corria sem fazer barulho, para fazer surpresa. O suor era frio com a brisa noturna e a luz gelada de uma lua tão apática. Foi chegando e diminuiu o passo um pouco e depois mais um pouco. Parou. Sorrindo, mas parado. Não sabia o que falar, não era um momento para palavras. Ela tinha a cabeça mirando o céu e as estrelas caíam serelepemente de seu cabelo. Ele se abaixou para pegá-las, as juntou todas, uma por uma. Ao se levantar, ela não mais estava. Não lá. A procurou virando o pescoço, a procurou mexendo os pés para outros lados. Achou mais uma ou outra estrela e seguiu o rastro. Andou um pouco e, ao olhar pra trás, a encontrou no mesmo lugar de antes. Voltou curioso, novamente em silêncio, enquanto carregava suas estrelas agitadas que insistiam em tentar fugir de seus braços. Parou bem atrás dela e estendeu os braços para mostrar-lhe o que achou. Ela se virou e os olhos dele caíram nos dela. Tão quietos. Ausentes, como a lua. Não olhava para as estrelas, não olhava seu sorriso. Não olhava nada. Nem piscava. Sua cegueira foi como uma bomba em seu estômago e ele, sem perceber, mergulhou naqueles grandes olhos negros e inertes. Caiu sem rumo, caiu sem fim. As estrelas o rodeavam como se zombassem daquela situação em queda livre. O ar se abria gelado pro corpo dele passar. Sem pára-quedas, sem asas, só a gravidade que o fazia temer e desejar o solo iminente. Sem conseguir entender direito o que acontecia, sentiu todo o corpo se chocar contra o chão duro ao lado da cama, com o cobertor ainda preso aos seus pés. Se levantou e notou o deserto que rachava embaixo dele, com todos os tons de cinza que sua vida em preto e branco lhe dava. Lá estava ela novamente. Não lá, mas logo ali. Ainda tão cega, tão desavisada de sua existência. Tão próxima. Correu novamente, tinha que lhe dizer o quanto lhe amava, o quanto não conseguia pensar em nada que não fosse em par. Se ela não enxergasse, o ouviria. Ela não poderia ser também surda, não, isso não. E se fosse, que ela o conhecesse por tato, pelos lábios, por abraços eternos com olfato e paladar no pescoço. Que fizessem algum sentido juntos. Corria, corria. Os cinzas se amarelavam enquanto as estrelas – aquelas mesmas – corriam atrás dele, às vezes o passando provocativamente, às vezes lhe beijando a face ainda suada. Quanto mais corria, mais o chão se rachava em pedrinhas, como se o deserto fosse uma enorme esteira, mais uma peça desencaixada que todas as circunstâncias pregavam: Quanto mais se movia, mais longe ela ficava. Era triste, tudo. Corria como se conhecesse seu destino, sua condenação. Só aceitaria tal sentença experimentando-a, então saltava – já que descobriu que saltando se deslocava melhor. Saltos largos, de pernas ora juntas, ora desconexas. Pulou para perto dela, com as estrelas ansiosas para ver o que aconteceria. A puxou pelo ombro e, quando ela se virou, tinha em suas mãos aquela massa carnuda que avermelhava o amarelado cinza. Sentiu o vento lhe entrar o peito, olhou para baixo e descobriu o buraco em seu tórax que vazava mais daquele vermelho. Via os batimentos nas mãos dela. Cada vez mais fortes, de pouco em pouco, mas cada vez mais constantes. A olhou nos olhos sem vida e sentiu um aperto maior. Era a dor que ele queria, porque era tudo o que lhe tinha a oferecer: Ela segurava aquele coração firmemente, com as pulsações pulando por entre seus dedos que piscavam o que as pálpebras se recusavam. Ele previu o que iria acontecer, tentou esboçar um grito. Em vão. De tão forte que segurava, aquela carne toda explodiu em estrelas numa noite gelada enquanto ele caía. Caía, queda livre com as estrelas ao redor dançando e rindo do ar que preenchia o vazio no peito. Ar, muito ar, de uma só vez, mas não havia liberdade, nem catarse: era uma queda sufocante e claustrofóbica. Preso, se sentia preso. Não mexia os membros e de repente nem caía mais, só se enrolava cada vez mais no cobertor. Olhos abertos. Se mexia inquietamente, na dicotomia de amá-la com todas as forças desejando odiá-la fortemente; No medo de dormir e sonhar com ela, no desejo de vê-la para sempre ao seu lado. Sentiu o vento pela janela, viu a maçaneta e correu para o alto. Não havia ninguém lá, nem a lua. Todo o ódio da situação brigava por espaço com o amor que sofreria o quanto fosse por alguém que não merecia. Corria determinadamente, sabendo que se não fizesse agora, nunca mais faria. Escalou com força o rochedo, tentando se desvencilhar das estrelas que o atrapalhavam. Correu para chegar lá em cima e não parou de correr, nem quando viu as ondas pequenininhas lá embaixo. Ele agora as via cada vez mais perto, enquanto todo aquele ar batia em cada centímetro do seu corpo. Não veria mais os olhos inertes, não repararia na ausência da lua, não teria que apostar corrida com as estrelas pra ver quem chegaria primeiro no mar. Era um último mergulho, a última queda. Ele não sentiu o mar bater, porque ela acordou assustada na iminência do impacto. Abriu os olhos e piscou. Limpou a saliva do canto dos lábios, ajeitou os longos cabelos que lhe cobriam a face. Sentou na cama, colocou os óculos e olhou a lua com todas suas estrelas que sorriam para a menina de olhos tão grandes que parecia lhes perguntar se ainda seria verdadeiramente amada.”

– Inspirado livremente em Sleep to dream her, da Dave Matthews Band

Consumação

19 de março de 2009

“When there’s nothing left to burn you have to set yourself on fire”

 

Sempre gostei dessa frase que ouvi na música do Stars. Assim como em todas as palavras mais sábias que já ouvi sobre viver, a questão não é o masoquismo ou a martirização, mas a consumação desgastosa que leva ao seu fim.

 

Cresci migrando por sub-culturas que me incitavam a ser alguma espécie de “coitado”. A olhos sociais, sofrer é merecer respeito, às vezes. Com o tempo, a vida real entrou sem pedir muita licença e comecei a entender que a verdadeira tristeza era um preço alto para pagar por qualquer realização pessoal.

 

Não consigo encontrar felicidade na dor, mas conheço o alívio do seu término. Quanto mais impedir que ela se desgaste, mais demorará para que eu possa respirar novamente, limpar o suor da testa e voltar a caminhar.

 

Então que doa até o fim, mas que acabe (pelamor).

 

 

Fisicamente

3 de março de 2009

Me dá tontura. Toda a agonia de pensar, de tentar fazer alguma ficha cair, de me deparar com o que já sei. Dá enjôo. Crise de labirintite. Insônia. Me faz ter que parar e respirar. Seja um mero estímulo visual, um resquíscio de alguma lembrança que inevitavelmente me conflita entre sorrisos e desesperos, alguma palavra ou algum lugar que eu esteja de passagem: me fazem ter que parar e respirar. Me seguro ao que fôr, seja as barras do ônibus, a parede ou a própria mochila, mas me seguro, diminuo o passo na iminência da perda de chão. E há o peso. A inconstante pressão interna que teima em variar apenas na cabeça. Até acne voltou a acontecer. Todos os sussurros de consequências e inconsequências e hipóteses e decepções e responsabilidades e vontades e erros e sonhos e medos. Todosaomesmotempo. Cansa.

Agora

17 de fevereiro de 2009

Queria que o blog fosse mais constante, que eu conseguisse postar com frequência, ao mesmo tempo que não consigo racionalizar tudo à tempo de sentar e digitar. Mesmo que seja só um desabafo, só um ímpeto de digitar ou uma elaboração detalhada do que vivo: preciso de tempo.

O presente tem sido cheio. Muitos sorrisos, reflexões sobre ética, reflexões sobre reflexões, palavras, pedidos, cafés, amigos, distâncias, aniversários, sentimentos novos, sentimentos velhos, medos, surpresas, sonhos, planos, livros, frustrações, gente nova, fotos, vontades, música nova, sono e horário de verão que foi embora e faz meu corpo acordar antes da hora.

Preciso parar e deixar sentir, parar e deixar fazer efeito. Preciso de tempo.

Repost (porque deu vontade)

9 de fevereiro de 2009

 Finjo sua ausência, invento a minha solidão.

Me leve a entender que estamos juntos apesar de quem sou. Me tire as asas, me ensine a correr no tempo certo, na direção que leva a na verdade quem sou, a me encontrar. Que eu ache a razão no riso, o gozo no poder respirar. Que minhas palavras exprimam e imprimam aquilo que ousei sonhar. Que eu possa aprender na falha dos meus atos, na culpa de desconhecer as dimensões do meu fazer e do meu não chorar.

E se um dia eu quiser me conformar, um dia eu prender o fôlego, faça alguma coisa, o melhor para nós todos: Me ensine a sacrificar o que nunca me teve importância além daquela que eu criei, quebre tudo o que tenta tornar concreto a distância que eu forço, mas não me deixe viver se viver for só observar de longe.

 

(originalmente postado em Superexposto)

Elefante

31 de janeiro de 2009

Ele se atrasou, como todo irlandês. Nem liguei, só de finalmente conseguir passar algum tempo com ele depois de todo esse tempo que nos conhecemos já me deixava feliz demais.

Já chegou tocando em assuntos delicados. Me lembrou que eu não sei lidar com minha racionalidade e melancolia que caminham tão juntas e brigam como irmãs, do meu desespero por não ter certezas e de como essas coisas afetam meus relacionamentos. Nem me deu tempo de respirar e contra-argumentar, já amenizou a situação dizendo que é normal fazer algumas coisas quando a gente sente demais. Calmo, direto e sincero, como qualquer amigo de verdade faz. Sem saber o que responder, chorei.

Aí, aproveitando o assunto, me contou as novidades. Nossa, como é incrível que bons amigos costumam viver coisas parecidas ao mesmo tempo. Eu sabia exatamente o que ele dizia, mas ao invés de me deixar falar, ele emendou com uma daquelas histórias do passado para me fazer rir. Ok, ele tem muito o que falar mesmo.

A noite continuou entre o compartilhar de intimidades e o fazer rir – um perfeito equilíbrio que requer muita mutualidade para uma conversa não se perder nessa linha tão tênue que separa a descontração da falsidade. Me fez chorar de novo nos momentos óbvios (me conhece bem) e desabafou um pouco mais.

Na hora de falar ainda mais sério, sobre aquele assunto que tanto conversamos desde que nos conhecemos, falou mais baixo. Não fez alarde, mas sussurrou sinceramente o que eu precisava ouvir – não necessariamente o que eu gostaria.

Viu como eu fiquei e me fez rir antes de ir embora. Não economizou tempo para me contar uma história, mas logo teve que me falar tchau.

Vai deixar saudades, mas amigos que moram longe são assim mesmo: A gente vive na ansiedade de vê-los de novo, se alimentando das lembranças boas e nunca acostumado com o tamanho da cumplicidade que temos, mesmo à distância.

Valeu, Irlandês. Ainda temos muito o que conversar.


Mid Season

17 de janeiro de 2009

E não me cansarei de comentar sobre como a vida muda o tempo todo. São personagens, tramas, cenários e até mesmo iluminações que variam de tempos em tempos, tudo seguindo a evolução dos protagonistas.

Esses últimos, coitados, seguem o roteiro e a direção apontados sem ao menos desconfiar do que está por vir. Reagem às falas e situações como lhes é possível, sempre sujeitos às câmeras e índices de audiência.

Em meio a tudo isso, o que faz a história andar é, em maior ou menos grau, justamente a mudança que os personagens sofrem. Coitados.

Rock Populi

29 de dezembro de 2008

Descobri que gosto de folk rock. Essa foi a tag que a Michelle me deu. Folk, que em alemão é volk (mas se fala igual em inglês) e em espanhol é gente (que se escreve igual em português, mas se fala com aquele R puxado da garganta) quer dizer isso mesmo, “povo”. Folk Rock, então, é o rock do povão. O curioso é que 92,3% das pessoas que eu conheço que possuem a mesma tag que eu morrem de medo de serem chamadas de povão.

Isso me lembra uma discussão que eu tive durante minha adolescência com uma dessas pessoas que se julgam mais interessantes que a maioria por curtirem a mesma coisa que a maioria de uma minoria curte. Ela tentava parecer cool por gostar de MPB e eu insisti em chamar o “estilo” (estranho e preconceituoso chamar música brasileira de “estilo”) de música POPular brasileira. Sim, tem pop no nome. Se é popular, é do povão.

Quem me conhece sabe que eu nunca temi nem o pop, nem o povo. Reconheço que é minha identidade que faz meu gosto musical e não o vice-versa (o que pra mim sempre foi óbvio, mas as pessoas insistem em crer o contrário), então vou ouvir o que me convir, até porque nunca escolhi gostar de nada do que gosto e não vou enrustir meu gosto musical pelo medo de perder meu senso de eu. Pelo contrário, na minha própria complexidade, não faria sentido me ater a apenas um ou outro jeito de se fazer música.

Quase mudando de assunto, descobri ainda que, ultimamente, a banda que eu mais gosto é Kings of Convenience. Justo eles que são tão folk e tão pop ao mesmo tempo. É uma dupla norueguesa que usa muitas cordas, o que os faz automaticamente super cool, ao mesmo tempo que fazem músicas gostosinhas de ouvir e tocam “Garota de Ipanema” (que é a música mais pop do planeta). Além de não terem medo de ser loser, não fumarem, não beberem e terem senso de humor, é essa dualidade deles que, talvez, mais me faça ter essa identificação com a banda.

Então, logo após a informação que falta um mês e um dia para o show do Damien Rice (que é mega folk e toca em novela das 8), deixo dois exemplos de Kings of Convenience: um mais folk e um mais pop (e, SIM, me é redundante falar assim).

(in)cômodo

23 de dezembro de 2008

Ao abrir os olhos, ainda podia se lembrar do som da porta batendo bem atrás dele. Levantou-se do chão e examinou o cômodo estreito e comprido que mais parecia um corredor largo. As paredes vermelhas e o chão de madeira pintado de verde denunciavam a idade da sala, com algumas rachaduras, a tinta descascada nas extremidades e o cheiro de mofo. Não havia teias de aranha, provavelmente porque muitos passavam por ali constantemente. Mas estava sozinho, era evidente que era o único ali. Olhou para trás e viu a porta, tão verde quanto o chão. Nunca se esqueceria dela. A conhecia intimamente, com a amargura de quem culpa uma porta pela própria atitude de ter girado a maçaneta. A maçaneta! Estava ali, toda redonda e metálica e engordurada de tantos dedos e nenhuma limpeza. Inutilmente a girou, já conhecendo o fracasso da tentativa de voltar. Hesitou em virar e encarar o outro lado da sala. Não se sabe ao certo quanto tempo demorou para que essa ação acontecesse, mas ele se virou sim. Virou-se e encarou a outra porta, pateticamente parecida com sua irmã gêmea que agora encarava a nuca dele. Andou cada passo até chegar lá no tal “outro lado”. Examinou-a e pensou: “É apenas outra porta”. Quase esboçando um sorriso, girou a nova maçaneta, tão redonda e metálica quanto a anterior e obtendo nenhum sucesso como antes. Tentou novamente, sem pensar no absurdo que seria estar preso naquele corredor largo de paredes vermelhas e piso verde descascando, mas seu temor se concretizava à cada semi-giro sem sucesso. Correu até a porta anterior, a forçou, tentou a arrombar. Veio correndo e fez o mesmo com a porta oposta. Que horror, não conseguia sair! Ao estapeá-la, viu os arranhões cravados na madeira feito pelos visitantes prévios. Sim, outros já estiveram ali e não estavam mais. Examinou o piso. Que mal gosto alguém ter pintado ele daquele verde. Não, nenhuma tábua estava solta, nenhum vestígio de alçapão. E o teto? Nada no teto. Absolutamente nada. Era alto e embolorado. Tateou as paredes tão lisas e rubras. Nada. Era inútil se mover, era inútil tentar. Respirou fundo e girou a maçaneta. Esperou alguns minutos (ele tentou esperar cinco minutos, mas é muito difícil contar cinco minutos sem relógio e com tanta ansiedade) e girou de novo. Nada acontecia. Olhou em volta novamente. Não estava escuro, nem muito claro, mas estava mais claro que escuro. Foi então que ele percebeu que não havia fonte de luz qualquer em todo o cômodo, mas ainda assim era possível enxergar as cores, as portas e a si mesmo. Achou muito estranho, mas não se deu ao trabalho de entender porquê. Girou mais uma vez, sem sucesso algum. Mas outros já tinham passado por ali, ele não era o primeiro. Não teria porquê ele não sair também. Assim, não faria sentido. “Não, não faria” foram as palavras dele. Com dor no coração e inclinado sobre a parede, ele se sentou.